sábado, 10 de maio de 2014

O Parque dos Dinossauros, de Michael Crichton


Testando novos formatos aqui no Fantasia BR, teremos pela primeira vez uma resenha dupla! O livro escolhido não foi ao acaso. Devido a nossa formação em Biologia escolhemos um livro que tem tudo a ver com isso: Parque dos Dinossauros. Desculpa se nos apegamos as bases científicas da obra. Coisas de cientista :)

Alysson: O filme O Parque dos Dinossauros, clássico da Ficção Cientifica brilhantemente dirigido por Steven Spielberg, foi um dos filmes que certamente marcaram minha infância, vi centenas de vezes que cheguei a decorar as falas. Não muito tempo depois descobri que o filme fora inspirado em um livro homônimo escrito por Michael Crichton, por muito tempo fiquei curioso pra lê-lo no entanto era muito difícil de encontrar pra comprar, até que um dia me deparei com ele em uma versão pocket em uma livrara em Brasília. Não pensei duas vezes em adquiri-lo. Porém da compra até a leitura transcorreram-se quase três anos, mas finalmente consegui terminá-lo e essas são as minhas impressões e as do Enio sobre esse clássico moderno da Science Fiction.

Enio: Quem não gosta de dinossauros? Quase todos nós fomos arrebatados na infância por esses seres envoltos em mistério que parecem ter vivido em outro planeta. Quem é da nossa geração com certeza ficou deslumbrado(a) com a versão desses “monstros” que o diretor Steven Spilberg apresentou no cinema. Mas você já leu o livro que inspirou a série de filmes? Pois prepare-se para ter uma incrível experiência literária ao viajar para o futuro e passado simultaneamente com essa incrível obra de Michael Crichton.

Enio: Fiquei completamente encantado com esse livro. Sempre fui fascinado pelos filmes da série Jurassic Park, mas depois de ler a obra original novos horizonte se abriram para mim. 

Alysson: Realmente livro e filme são bem distintos e isso foi uma grata surpresa, um dos motivos de ter adiado tanto a leitura foi o medo de ler algo repetitivo. 

Enio: Fazendo uma comparação entre o livro e o filme, achei que a melhor mudança que a adaptação para o cinema fez foi o “crescimento” a Lex. No livro ela é uma pirralha chata que só serve pra irritar todo mundo, inclusive o leitor.

Alysson: Em relação aos personagens, achei a Lex um porre de chata também e tinha vontade de rasgar fora as partes que o Ian Malcolm falava demais sobre a sua teoria do caos, gostei mais dele no filme que no livro. O cara, mesmo na hora do perigo não fechava a matraca! Allan Grant foi mais bem retratado no livro e o velho dono do parque é um completo idiota ganancioso. No filme lembro de ter simpatizado com ele.

Enio: É verdade que no filme só mostra o lado sonhador e deslumbrado do dono do parque, o que também me deixou até com a impressão que era outro personagem. 

Alysson: Como biólogo, por formação assim como o Enio, fiquei fascinado com o tema abordado no livro, sobre os avanços da biotecnologia e a possibilidade de se recuperar, através da engenharia genética, seres extintos de eras atrás. 

Enio: Sobre o tema biotecnologia, o livro explora bem a visão que muitas pessoas tinham naquela época sobre o avanços desse ciência. Você pode notar isso em muitas obras dessa época. Tinha-se uma perceptiva muito otimista para o futuro próximo e que se revelou hoje, vinte anos depois, falha. 

Alysson: Apesar de isso ser uma belíssima teoria, sabemos que isso, como estudos recentes mostram, nunca será posto em prática. 

Enio: Acontecesse que a técnica apresentada por Crichton precisaria de uma quantidade enorme de DNA (ou ADN, como preferirem) intacto. Entretanto estudos revelam que o DNA não sobrevive nem 7 milhões de anos, e os dinossauros viveram a 65 milhões de anos atrás. Logo, não veremos dinossauros vivos andando pro ai em nenhum parque ou zoológico.

Alysson: Porém a maneira como o autor se utilizou dessa utópica possibilidade de se clonar dinossauros foi bem convincente e aposto como deixou muitos leitores na época do lançamento (1991) com uma pulga atrás da orelha, pois dinossauros são seres admiravelmente belos, mas terrivelmente assustadores também.

Enio: Indo um pouco mais a fundo no processo descrito no livro, mesmo se achássemos uma sequência de DNA incrivelmente preservada de dinossauros, sair remendando as partes que faltam com sequências de qualquer animal como do Dr. Wu fez não ia rolar. Essa foi a coisa que mais me incomodou no livro todo. Provavelmente o que ia resultar disso eram vários ovos inviáveis, e com sorte alguns fetos grotescos.

Alysson: Justamente! Isso foi umas coisas que mais me incomodou no livro também, eles utilizavam qualquer sequência de DNA de qualquer espécie pra colocar nos pedaços que faltavam no dos dinossauros, como se o DNA fosse um quebra cabeça de criança onde se pode sair remendando facilmente aquelas quatro letrinhas (A T G C). Sem contar que eles mexiam às cegas sem saber que pedaços do DNA seriam sequências codificáveis (genes). E se fossem, eles realmente saberiam que proteínas essas sequencias iriam produzir? Que seres iriam ser produzidos? O livro fala que era um jogo de erros e acertos, mas eles acertaram demais pra soar convincente. E tudo em 5 anos! 

Enio: O mais provável é que se usasse só DNA de aves, os parentes vivos mais próximos dos dinossauros, mesmo assim sem garantias. Isso me lembra de outro ponto. O livro insiste em dizer diversas vezes que os dinossauros não são répteis, mas mais parecidos com as aves. Embora as justificativas que o livro apresenta não estejam erradas, considero que esse debate é irrelevante. 

Alysson: A maneira de se classificar os seres vivos não é uma unanimidade na ciência, existem diversos sistemas de classificação propostos, alguns são aceitos outros não. Os dinossauros são descritas nos livros como os parentes mais próximos das aves, mas é uma linhagem extinta de répteis sim.

Enio: Acontece que a Biologia trabalha hoje com uma classificação dos seres vivos que tenta reproduzir a sua evolução. 

Alysson: Indo mais a fundo todos os seres tetrápodes amnióticos são linhagem evoluídas dos répteis, isso inclui nós, mamíferos. 

Enio: Assim o “grupo” dos répteis inclui sim os dinossauros, mas por uma questão de paradigmas exclui dois ramos dessa árvore genealógica, os mamíferos e as aves. 

Alysson: As aves, por possuírem características exclusivas, não são répteis, mas sim descendente de uma linhagem destes, provavelmente a mesma da qual surgiram os dinossauros. 

Enio: Dessa forma pode-se considerar as aves como, na verdade, os dinossauros que sobreviveram e poderiam ser portanto também classificadas répteis. Essa mudança na classificação não ocorreu, mas Biologia está deixando de classificar os seres vivos por “características” compartilhadas, como o sangue frio, para agrupá-los por parentesco evolutivo.

Alysson: Acho também que o livro abordou bem pouco essa questão biomolecular, sobre a complexidade envolvida na expressão dos genes, penso que de propósito, pois é perceptível que Crichton, apesar de não ter sido biólogo, sabia muito sobre o que falava no livro.

Enio: O autor falhou também em explicar sobre comportamento animal. Ele foi categórico ao falar que era impossível se prever o comportamento animal com base na sequencia de DNA, mas isso não está totalmente certo. Talvez não tenhamos conhecimento suficiente na área, mas isso é sim possível até um certo ponto, já que o comportamento também é influenciado fortemente pelo ambiente.

Alysson: Essa coisa de que o comportamento é influenciado pela genética, ele tentou dar uma explicada puxando no final. Aquela ideia de dizer que os dinossauros eram aves primitivas, quando mostrou os raptores tentando “migrar”, aí ele meio que se contradisse né?

Enio: O livro, além de falar muito sobre avanços da ciência na área de Biologia, também fala muito de computadores. Eu também tenho formação na área de informática, mas confesso que não conheço como funcionavam os sistemas informatizados por volta do ano 1991. Entretanto não consegui perceber nenhuma problema nas explanações sobre o sistema do parque e sua programação.

Alysson: Achei sobre os sistemas computadorizados e as demais geringonças “modernas” do parque muito chatas. Imagino que para os leitores da época, como eram descritos tecnologias de ponta, fosse mais interessante. Hoje como a tecnologia faz parte de praticamente tudo, até ler sobre avanços recentes é um tanto chato. Pra mim essa questão serviu apenas como gancho para o desenrolar da trama, já que foi o sistema falho, com uma ajudinha, que desencadeou a liberação das feras do parque. Confesso que pulei alguns parágrafos, por que ler aquelas explicações após um ótimo capítulo de ação era como tomar um banho de água fria.

Enio: Eu gosto de ler sobre tecnologia então não achei nada disso chato (risos).

Alysson: Como já falei, eu achava o Malcolm um chato e tanto! Eu sempre achei a Teoria do Caos interessante, mas o cara falava demais sobre a coisa e meio que cortava o clima do livro, assim como os computadores e suas explicações sobre o funcionamento do parque faziam.

Enio: Eu já havia, em outra ocasião, tentado entender um pouco mais sobre a teoria do caos, mas devo admitir que fiquei boiando em meio a tantas explicações técnicas sobre o tema. Foram as palavras do Malcolm, com uma explicação menos técnica e portanto mais fácil de compreender, que me fizeram ter uma visão um pouco melhor sobre a teoria. Tudo isso ficou mais maçante, eu acho, só próximo ao final do livro. Mas mesmo assim, aquelas viagens teóricas que ele faz me renderam boas reflexões. 

E pra concluir:

Alysson: A Biologia não é uma ciência exata, muito do que eu aprendi no Ensino Médio mudou de figura quando entrei na graduação, e com os avanços da ciência cada vez mais descobrimos coisas novas e os horizontes sobre o entendimento da complexidade da vida não estão mais tão distantes de nós. Por isso questões sobre ética e bioética são cada vez mais debatidas entre os cientistas. Uma das coisas que o livro aborda é a utilização irresponsável do conhecimento biológico para fins obscuros. Mendel, o pai da Genética certamente teve medo de que sua descoberta sobre os genes fosse utilizada para selecionar deliberadamente características “desejáveis” e eliminar as que não serviam, quebrando a maravilha da variabilidade que existe na natureza. Clonar dinossauros pode ser um sonho, mas hoje os cientistas já conseguem manipular a molécula base da vida e a questão sobre o uso irresponsável das técnicas e do saber cientifico é um fato muito bem abordado por Crichton em O Parque dos Dinossauros.

Título original: Jurassic Park (1991)
Autor: Michael Crichton
Ano: 2009
Editora: Rocco e L&PM
Páginas: 488

0 comentários:

Postar um comentário