segunda-feira, 24 de março de 2014

A Dança da Morte, de Stephen King



O futuro apocalíptico imaginado por Stephen King me marcou de uma maneira tão profunda que não sei expressar muito bem tudo que senti lendo esse livro em uma simples resenha, certamente A Dança da Morte foi um dos maiores (se não o maior) e melhores livros que já li na vida. Um prato cheio com tudo aquilo que os ávidos leitores do “Rei” mais gostam em suas tramas inteligentes e bem elaboradas. Terror, ficção cientifica, drama, fantasia e de sobremesa um profundo debate filosófico sobre o futuro da sociedade, moralidade, a natureza humana, Deus, e o verdadeiro significado do bem e do mal.

Uma arma biológica, um vírus secretamente estudado em um laboratório, o chamado “Projeto Azul”, escapa do controle do laboratório contaminando todos no local e por uma série de pesquemos acasos acaba escapando para fora e causa um efeito dominó que devasta nada menos que 99% da população mundial. Inexplicavelmente, o vírus, que é bem semelhante ao HIV, não afetou alguns poucos e através de pontos de vista de alguns desses sobreviventes vamos acompanhando a sua jornada na busca de sobreviverem após o fim do mundo.

Bom, até ai parece mais um livro pós-apocalíptico, não? Então o que faz A Dança da Morte diferente de outros livros que tratam de temas semelhantes? Recentemente tive contato com obras parecidas como A Estrada e Eu Sou A Lenda que apesar de serem distintos, no fundo falam da mesma coisa. O diferencial dessa obra prima de King é o fato de não se restringir a apenas ao “fim do mundo”. Depois disso, primeiramente o livro narra a tentativa de reconstrução da sociedade onde questionamentos e discussões filosóficas são oferecidas ao leitor, profundamente de natureza sociológica, claro, mas também sobre a natureza humana. O que realmente é o bem ou mal e como acontecimentos corriqueiros ou até mesmo banais podem moldar as nossas decisões ou nossa personalidade. E mais pra frente o livro se torna um verdadeiro épico de horror, um grande embate entre o bem e o mal no melhor estilo King que é o ponto diferencial dessa obra. Ficção científica, fantasia, drama e horror se misturam em um épico de proporções gigantescas (literalmente) onde o foco final foi a luta entre o bem e o mal, parecido com O Senhor dos Anéis. Inclusive, nesse livro, King faz inúmeras homenagens ao mestre da fantasia, J R. R. Tolkien, citando-o em várias partes do livro.

A Dança da Morte é dividido em três partes. Na primeira, Capitão Viajante, somos apresentados aos personagens centrais e às consequências da epidemia da supergripe causada pelo vírus que escapou do laboratório que também é conhecida como Capitão Viajante. Essa parte então narra como os poucos sobreviventes lidam com catastrófica situação que muda drasticamente tudo ao redor. Aqui é onde King também constrói aquela aura inquietante de terror e sobrenatural que só tende a crescer no decorrer da trama, culminado com cenas de tirar o fôlego, e também apresenta seus personagens centrais, seus dramas e suas histórias o que os torna bastante vívidos. Uma moça grávida, um cantor pop iniciante, um homem taciturno do interior, um velho sociólogo pessimista, um carismático surdo mudo e um retardado muito simpático figuram entre os personagens principais da trama. Uma coisa que achei muito boa foi a evolução destes personagens no decorrer do livro, até alguns dos “malvados” tiveram seus pontos altos.

Na segunda, Na Fronteira, é onde os sobreviventes começam a ter contato mais direto com o sobrenatural, pois todos sonham ou com uma velha e bondosa senhora de 108 anos, Mãe Abagail, ou com o temível homem escuro, o famoso vilão de King, Randall Flagg. Aqui os personagens fazem suas escolhas e partem para a tentativa de reconstruir o mundo. Os “bons” se juntando a Mãe Abagail e os “maus” se juntam a Flagg. Aqui acho interessante mencionar que nem todos são 100% bons ou maus, todos eram acima de qualquer coisa humanos e até mesmo seus líderes, Abagail que representava o bem, e Flagg que representava o mau, tiveram seus momentos de falha. O que King deixa claro também é a questão do livre arbítrio, a maioria sonhava com os dois lados e escolhiam aquele que mais lhe agradasse. Essa segunda parte foi a que teve seus momentos de calmaria, até demais pro meu gosto, algumas passagens foram um tanto chatas e sem propósito definido.

Na terceira, A Resistência, é quando os caminhos se convergem e os dois lados começam a ver um ao outro como uma ameaça para a sua sobrevivência. Essa última parte culmina com cenas emocionantes e surpreendentes. Foi a parte que li mais rápido, em um dia apenas, e depois da leitura respirei fundo e me dei conta de que King conseguiu escrever um livro melhor que O Iluminado, que pra mim tinha sido a melhor obra dele. Alguns podem discordar de mim, mas A Dança da Morte é o melhor livro de King, e quem acompanha A Torre Negra vai encontrar na saga inúmeras referências a esse livro, começado por Flagg.

Algumas partes de A Dança da Morte podem soar meio religiosas, em especial na segunda metade do livro. Mas o que me pareceu foi uma coisa meio dúbia, que ora soava religioso ora profano, bem no estilo King, o que fica bem interessante. Só que Stephen King não escreveu uma obra ateísta ou religiosa apenas levou em conta tudo aquilo que passam por nossa cabeça no que se refere ao sobrenatural, não dando o crédito total à fé religiosa. Toda a trama de terror e drama tem então uma capa religiosa bem trabalhada onde King ousou ao fazer referências claras à Bíblia, do Êxodo ao livro do Apocalipse, sem contar as inúmeras passagens que acompanhamos no decorrer do livro. Faço uma menção honrosa à uma citação do salmo 23 perto do final da parte 3 que me fez chorar horrores!

Por fim, ler a dança da morte foi uma verdadeira viagem. Enquanto lia me senti realmente na companhia desses personagens em sua peregrinação através de um país devastado, onde a aura de morte impregnava tudo. Em sua escrita detalhada King faz com que o leitor sinta tudo no ambiente que cerca seus personagens, bem como experimentar na pele o que eles sentem intimamente. A cena em que Larry Underwood (o cantor), fugindo da Nova York devastada, atravessa o túnel Lincoln, escuro e cheio de corpos em decomposição me deu calafrios. Pude sentir na pele o medo e o pânico de Larry bem como a aura sombria de um local que só cheirava a morte. Isso mostra como King é um verdadeiro gênio da escrita, não só de horror, por que tudo que o cara escreve é muito bom e de uma qualidade sem tamanho! E hoje sem a menor sombra de dúvidas coloco o Rei no topo da lista dos meus autores preferidos.

Esse livro recentemente foi lançado com uma nova capa e letras maiores pela Suma de Letras. As 944 páginas da edição da Objetiva se transformaram em 1248 páginas que assustam qualquer leitor, mas o que aumentou em páginas diminuiu em preço o que antes custava até R$ 100,00 pode ser adquirido por até R$ 67,00 ou por R$ 30,00 na versão digital.

A Dança da Morte teve uma adaptação pra TV datada de 1994 e pode ser encontrado em DVD. Recentemente a Warner anunciou que lançará um filme baseado na obra, mas atualmente está apenas no papel. Fica a torcida para o filme sair o mais breve possível!

Título original: The Stand (1978, 1990)
Tradução: Gilson B. Soares
Editora: Suma de Letras
Páginas: 1248

3 comentários:

Acabei de ler essa que eu considero a obra-prima do mestre King. É impressionante o modo como o livro te cativa do começo ao fim. Igualmente impressionante é o modo como seus sentimentos são aflorados no decorrer das mais de 1200 páginas; Medo, empatia, euforia, decepção, raiva... King é o rei mesmo (sem trocadilho). E, sim, "A Dança da Morte" e melhor que "O Iluminado".

O Iluminado é bastante querido pela maioria dos fãs do King, mas não se compara com A Dança da Morte! É um épico maravilhoso que traz realmente todas esses sentimentos que você falou. King sabe ser sutil mesmo em calhamaço de 1200 páginas que você lê tão vorazmente que esquece do tamanho do livro! Abraços e

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